Em Eldorado do Sul, nove envolvidos em saques foram presos semana passada após serem flagrados em imagens de câmeras de segurança
Saqueadores que atuam em meio à enchente que atingiu o Rio Grande do Sul deram um prejuízo de cerca de R$ 30 milhões a empresas de Eldorado do Sul, como o leitor já leu em GZH. O que é pouco comentado é que eles foram identificados com ajuda das vítimas.
Os saques começaram logo que as águas do Jacuí tomaram as ruas de Eldorado do Sul, uma das cidades mais atingidas pelas cheias de maio. A catástrofe deixou submerso cerca de 80% do território do município, com imensa destruição de residências e empresas.
Os saques aconteceram em 17 empresas. Falamos com o dono de uma distribuidora de alimentos, que atende 90 cidades, num raio de 350 km da Região Metropolitana. Ele sofreu três ondas de saques, protagonizados inclusive por pessoas ligadas a facções criminosas.
A primeira onda aconteceu no sábado, 4 de maio, pela manhã. O rio transbordou e ilhou a empresa. Um grupo de 20 pessoas invadiu a distribuidora, alegando fome.
— Sem problema, vou conseguir para vocês. Prometi café, massa, biscoitos. No que entrei no depósito, invadiram. Quebraram uma porta e começaram a saquear. Vieram uns 50. Pegavam de tudo, caixa de água, geladeiras — descreve o empresário.
Foram duas horas de saque, na primeira manhã. Depois vieram uns sete, às 21h do mesmo sábado, "quando a cidade estava num breu, sem luz em lugar nenhum", descreve o empreendedor. Ele disse que se assustou com as lanternas dos invasores. Conversou, ofereceu ajuda, aí foram embora com gêneros alimentícios.
Aquilo que ele chama de devastação geral aconteceu domingo, 5 de maio. Quando amanheceu, apareceram cerca de 70 pessoas na distribuidora de alimentos. Conforme o empresário, tinha até gente com tornozeleira eletrônica.
— Brigavam para ver quem devastava mais. O saque generalizado foi das 7h às 13h. Umas 300 pessoas passaram lá ao longo do dia. Não conhecia nenhum deles, apesar de um dizer que foi ex-funcionário da empresa.
O empresário diz que gravou vídeos dos flagrantes de saque e obteve outros, a partir das câmeras de vigilância da empresa. Cansou e apelou para as polícias, Militar e Civil. Que passaram a investigar o caso.
O que deixa o empresário inconformado é que o saque não se resumiu a alimentos. Algumas pessoas até tentavam evitar depredações, gritando: "É sem bebida, sem estragar, sem depenar, senão o homem vai cortar". Mas os apelos não surtiram efeito.
— Cheguei num corredor, estavam abrindo as caixas de uísque e vodca, 60 a 70 garrafas, botando em latões de lixo e levando. Perguntei se não era para levarem só comida. Um deles respondeu "Não te mete. Comida é pras crianças e mulheres, nossa comida é o trago" — lamenta o empresário.
Ele resolveu colaborar com a Polícia Civil, cedeu os vídeos e ajudou a identificar os autores, quando questionado. O mesmo aconteceu com outros empresários. É o caso de uma revenda de máquinas agrícolas, cujos tratores foram roubados por saqueadores, à mão armada. Os próprios criminosos levaram vários desses veículos, dirigindo. Funcionários da empresa ajudaram policiais a localizarem e recuperarem os tratores. O resultado da ação conjunta da Polícia Civil, BM, PF e Marinha foram toneladas de produtos levados pelos ladrões que acabaram recuperados - e um fio de esperança a animar as vítimas. Até agora, no Rio Grande do Sul, as polícias prenderam mais de 65 pessoas envolvidas em saques.